24.4.08

Sobre o Tempo

Ando sentindo o tempo. A sua presença, quero dizer. Como um ente atuante sobre o mundo físico. Mas não sobre os critérios conhecidos de um mensurador de etapas evolutivas do soma, ou de um parâmetro assombroso de decrepitude e indicativo de morte. Não. Uma nova percepção tem, aos poucos, se infiltrado em meus pensamentos. É como se ele, o tempo, estivesse se materializando diante dos meus olhos. Eventos passados e futuros se cristalizam em pequenas observações diárias.

Certamente alguém já deve ter teorizado sobre isso, mas o meu arcabouço de conhecimentos é demasiado pobre e a minha memória não é lá muito minha amiga. De modo que, o que digo aqui, pode ser fruto de experiências e conhecimentos acumulados, embora eu não vá saber citá-los, nem por um enorme esforço mental, nem por um chute despretensioso da intermediária... A minha rasa intelectualidade também não me permite usar do vocabulário adequado para o tema. Prometo, em outra oportunidade e se me permitirem, voltar a esta questão com mais propriedade. Por ora, tentarei apenas expor as idéias, sensações e intuições que tenho tido nas últimas semanas da maneira mais clara que puder (ou não).

Retomando o primeiro parágrafo, venho percebendo que os meus sentidos têm se aguçado recentemente e acho que estariam, de certo modo, se entrelaçando numa espécie particular de sinestesia. O que antes era apenas imagem, ou apenas paladar, torna-se algo mais completo, catalisando uma maior gama de sensações simultaneamente, criando em minha mente, relações com coisas outrora absolutamente desconexas. Pode ser que esse tipo de experiência sempre tenha havido, mudando agora apenas na intensidade da percepção. O que importa é que essas novas sensações estão centrando as minhas atenções e a minha curiosidade hoje. Venho tentando, de algum modo, organizar estas experiências de uma maneira inteligível para mim. E este texto é a primeira concretização viável desta tentativa, embora ela já venha me ocorrendo há alguns meses e exista uma possibilidade real de que qualquer tentativa de “racionalizar” estas experiências acabem por anulá-las.

Cada momento como esse (em que ocorre a interconexão de sensações, memória e tempo) é exatamente indescritível e, o que posso apresentar seria, simplesmente, uma tentativa de apresentação de cada componente do evento em separado, seguido das minhas considerações/alucinações posteriores àquele momento. Um pássaro que repula espevitado em seu ninho, por exemplo, pode instantânea e simultanemanete me remeter à brutalidade da Guerra do Vietnã, à rapidez da cor amarela, à pungência e esplendor de uma ópera de Verdi e/ou a uma queda de bicicleta na infância. O que mais me impressiona e intriga é com que clareza e naturalidade coisas tão distintas quanto essas adquirem, naquele instante, uma ligação evidente, como se todas dependessem umas das outras para se concretizar. Mas tão fugaz e ofuscante quanto um relâmpago, aquele evento se desmancha no tempo e espaço, deixando-me igualmente assombrado e deslumbrado. E eu fico a vagar por longos minutos em meus pensamentos e elucubrações.

À parte de minhas concepções/confusões religiosas, estas mega-epifanias, têm me proporcionado importantes momentos para reflexão sobre as grandes e eternas questões humanas: quem sou, de onde sou, para onde vou, o que devo seguir, ou mesmo, se devo seguir algo, sobre as consequências dos meus atos, etc. Acho que há alguma verdade que pretende revelar-se a mim por esses meios, algo que foge aos conceitos que fui condicionado a ter. Algo que, ao ser percebido, operará uma transformação profunda da maneira como vejo o Mundo. E assim, consequentemente, também transformará o modo como eu vivo sobre ele.

P.S.: É provável que este texto ainda não esteja pronto e que seja remendado em breve (depois de alguma outra mega-epifania, ou não).