Há tempos atrás, li um artigo de um estudioso inglês no suplemento Mais da Folha de S. Paulo que, infelizmente, perdi. Tratava da relação da prática do futebol e dos seus fundamentos, com as práticas e fundamentos das guerras. Basicamente estabelecia uma relação entre a formação das equipes e torcidas do football com os conceitos primordiais de identidade tribal.
Essa identidade, fundada na exclusão (muitas das tradicionais equipes européias e sul-americanas foram criadas sob égides aristocráticas ou de conotações racistas e etnocêntricas), se assemelhava à formas de organização dos grupos guerreiros defensores de tribos, extendendo-se, posteriormente, e de forma análoga, à complexidade dos exércitos e batalhões de formação nacionais.
A conformidade de batalha campal, onde dois teams opostos tentavam carregar um objeto até o outro lado do “território inimigo”, a utilização de cores e uniformes para associação, tal qual faziam os primeiros guerreiros, que se pintavam para ser imediata e honrosamente identificados com a sua tribo. E ainda, com a introdução de escudos, bandeiras, hinos, cânticos e gritos de guerra pelos clubes e torcidas, tudo remetendo à constituição revolucionária das nações européias, como se dera a séculos passados, são sinais de como essa ligação entre futebol e guerra é bem-sacada.
O cerne da questão aqui é que o homem moderno, cidadão, operário ou trabalhador dos escritórios, contribuinte de impostos, e sujeito às leis e imposições da sociedade, foi privado, para o bem desta, da manifestação de sua natureza irascível e beligerante. Na dita Sociedade Moderna e Iluminada (pré-Guerra Mundial) não caberia mais a brutalidade e selvageria das batalhas entre homens, do sofrimento e do derramamento de sangue de inocentes. Desta forma, toda a energia bélica inerente à índole masculina teve de ser represada e canalizada para algum outro meio menos hostil e danoso. E não houve outro mais propício à aceitação e difusão pelo homem comum do que o Esporte.
Ao mesmo tempo, no florescimento do futebol, em fins do séxulo XIX, legiões de trabalhadores das indústrias e minas de carvão inglesas, identificaram rapidamente nesta prática esportiva uma rara possibilidade de entretenimento, pois, naquela época, isso lhes era praticamente vedado. E para se praticá-lo pouco se exigia além de uma simples bola e um bom espaço aberto. À revelia da aristocracia, com seus clubes exclusivos, o esporte se difundiu por seu baixo custo, e por não exigir dos seus praticantes uma compleição física determinada e exuberante. Não era necessário ser muito alto, nem muito forte. Tampouco, o mais veloz. Bastava apenas a habilidade para driblar os adversários e alcançar a meta (Goal). E, guardadas as devidas proporções, assim é até os dias de hoje. O futebol é atividade democrática por excelência. E esta é uma das razões para a sua enorme popularidade nos quatros cantos da Terra.
(continua...)
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